segunda-feira, 12 de julho de 2010

Cidade Invisível

Do invisível das cidades

"De uma cidade não aproveitamos suas sete ou setenta e sete maravilhas, mas às respostas que dá às nossas perguntas"

"Partiram em busca daquela cidade, não a encontraram, mas encontraram uns aos outros; decidiram construir uma cidades como a do sonho"

"Existe uma contínua vibração luxuriosa em Cloé, a mais casta das cidades. Se os homens e as mulheres começassem a viver seus sonhos efêmeros, todos os fantasmas se tornariam reais e começaria uma história de perseguições, de ficções, de desentendimentos, de choques, de opressões, e o carrossel de fantasias teria fim."

"- Sim, o império está doente e, o que é pior, procura habituar-se às suas doenças. O propósito das minhas explorações é o seguinte: perscrutando os vestígios de felicidade que ainda se entreveem, posso medir o grau de penúria. Para descobrir quanta escuridão existe em torno, é preciso concentrar o olhar nas luzes fracas e distantes."

"- Ao passo que mediante o seu gesto as cidades erguem muralhas perfeitas, eu recolho as cinzas das outras cidades possíveis que desapareceram para ceder-lhe  lugar e que agora não poderão ser nem reconstruídas nem recordadas. Somente conhecendo o resíduo da infelicidade que nenhuma pedra preciosa conseguirá ressarcir é que se pode computar o número exato de quilates que o diamante final deve conter, para não exceder o cálculo do projeto inicial."

"Você sabe melhor do que ninguém, sábio Kublai, que jamais se deve confundir uma cidade com um discurso que a descreve. [...] A mentira não está no discurso, mas nas coisas."

segunda-feira, 5 de julho de 2010

Dorotéia

Pequeno, de aproximadamente 7 cm, provavelmente algum tipo de porcelana, mas um olhar desatento diria que é madeira. Em linhas gerais seria oval, se não fosse a parte inferior bem achatada para poder mantê-lo de pé; a parte de cima levemente achatada, e a frente com um relevo peculiar. Em sua maior parte é pintado de vermelho com algumas poucas pinceladas de dourado, algo quase paralelo, duas em cima, duas em cada lado oposto, em baixo continuando para a parte mais peculiar se encontram quatro, mas não cobrem grande área ai. Possui nesta parte duas saliências arredondadas de cor branca, mas uma se encontra pintada com algum tipo de material a base de carbono; há uma pequena reentrância pintada de vermelho, mas ao redor da pequena reentrância a coloração é algo que fica entre o branco e o bege. Há ainda nesta parte quatro áreas pintadas de preto, duas acima e duas abaixo das saliências arredondadas.

Sinal de um momento de transformação e de decisão, que foi ganho de alguém especial como cuidado e carinho. É a materialização de um desejo em processo de realização, o lembrete de um objetivo e que trás o conforto de ser ele mesmo símbolo do que ainda não existe, mas se corporifica diariamente em ações e reações,  positivas no geral. Suor e lágrimas o formam, alegrias também, mas a esperança continua a ser seu nome espiritual. Houve, atrelado a ele, dúvidas, mas o fato de o tocar as transformaram em energia para uma nova investida. Sua aparência é cambiante, mesmo que sua estrutura permaneça, contudo é possível que de uma hora para outra ele se transforme, se desmanche, e o curioso, é que exatamente este risco o mantém estável.

Tudo se encontra ai, mas ainda falta muito. Para se entender e para se completar.

sábado, 3 de julho de 2010

O Verdadeiro Fantástico

Nosso tempo, para aqueles com espírito de aventura, pode nos parecer o pior dos tempos. O desejo de conhecer algo exótico e único, esbarra no fato de que não há lugar no mundo que já não foi esquadrinhado, medido, catalogado, colonizado  e vendido. Não há mais sonhos de se encontrar Eldorado, Atlândida, dinossauros em lagos escoceses, o mundo se desencantou.  Hoje há crianças subindo o monte Everest e fazendo sozinhos a volta ao mundo pelos mares, tudo parece ter ficado tão pasteurizado. Há, como sucedâneo, a imagem criada pela computação gráfica nos dando tudo que nosso desejo quer, até a exaustão e o tédio.

Mas então me deparo com a primeira descrição feita por um Marco Polo fictício sobre a cidade de Diomira, para o Kublai Kan, num livro de Ítalo Calvino, "As Cidades Invisíveis". Sua descrição é antes uma inversão do olhar. Descreve com desdem o que nossos olhos teriam avidez para ver: um teatro de cristal, um galo de ouro que canta, setenta cúpulas de prata.

"Todas essas belezas o viajante conhece por tê-las visto em outras cidades"

Então, Marco Polo expõem o que há de fantástico naquele lugar: a lembrança de uma noite de amor.
A inversão de um fantástico exterior de imagens sólidas à experiência pessoal unica repõem no mundo a possibilidade do maravilhamento. O reencanto não precisa mais, como nos tempos do romantismo, de uma terra longínqua, pode ser encontrado a cada esquina da vida.

segunda-feira, 28 de junho de 2010

Nihilismos

Quem nunca ouviu a frase "nada tem sentido" ou "tudo é relativo" em meio a uma discussão sobre algo, transformando todos os argumentos e idéias em um monte de pó, travando não apenas o debate, mas o próprio uso do intelecto para toda possibilidade de se entender algo?

Pior, a inexistência do sentido é algo que considero certo, assim como uma grande parcela de pessoas mais intelectualizadas. Então o que fazer? Parar de pensar sobre questões mais complexas e se manter na mais pura superficialidade? Mudar minha forma de pensar e começar a crer numa verdade universal? Há alguma outra saída para esta armadilha?

Inicialmente acho importante ressaltar uma motivação e uma impostura que andam juntas no uso destas frases muito batidas. É comum que quem as diga o faça para por um ponto final numa discussão, seja por que cansou de pensar, seja porque considera que é impossível chegar a um acordo. Assim a frase caí como uma pedra que sepulta um debate já enfadonho. Mas, ao mesmo tempo, a pessoa que afirma isso age literalmente como hipócrita - quem diz uma coisa e faz outra - pois continua, em outros assuntos, a lançar afirmações sobre como as coisas são ou deveriam ser, assim como não começa a fazer coisas sem sentido que seriam naturais num mundo sem absolutamente nenhum sentido.

Ora, ninguém para de beber sua cerveja e começa a mastigar o copo ingerindo cacos de vidro, ou plantar bananeira em cima da mesa, cantando músicas em aramaico, ou coisas "sem sentido" como poderíamos esperar num mundo onde tudo e relativo, em que tanto faz uma coisa ou outra seja lá o que for.

Numa construção mental posso dizer que há 3 tipos de nihilismo: o primeiro que só pode existir no mundo das idéias é aquele em que o sujeito, além de afirmar categoricamente que não há sentido em nada, age da mesma forma, aplicando a aleatoriedade como forma de vida. Tal sujeito não poderia existir por muito tempo, pois não encararia coisas como alimentação e cuidado de si como necessárias e talvez se jogasse de uma janela achando que pode voar, pararia de comer, ou algo assim "sem sentido".

Bem, como quem diz "nada tem sentido" continua vivo e agindo como uma pessoa normal, fica claro que há contradição no pensar e no agir, que seria um segundo tipo de nihilismo, o nihilismo como "malandragem", usado como arma, rota de fuga, ou qualquer coisa que sirva para levar uma vantagem pessoal em uma situação problema.

Um último tipo seria aquele em que se aceita a inexistência de sentido no mundo, mas no mundo-em-si, ou seja, as coisas e a vida não podem produzir um sentido por elas mesmas, não há um sentido ancestral que foi dado antes do mundo, desígnios ou destino a que todos concorrem. Uma coisa não é nada até que alguém lhe dê um nome e a insira dentro de um discurso, mas no momento em que há sujeitos que organizam as coisas, o sentido começa a aparecer também, como criação humana. 

Nada tem sentido em si mesmo, mas as pessoas produzem sentidos para as coisas e é esse sentido construído que nós podemos discutir e avaliar intelectualmente.

Todos os dias enchemos nosso mundo mudo de sentidos, de idéias, pensamos sobre ele, avaliamos, tomamos decisões, interagimos com outras formas de sentido dado por outros grupos de pessoas. Isto é uma realidade da qual ninguém se furta, deixar de agir assim seria, como já exposto, agir aleatoriamente a cada segundo. 

Para complementar, quando se diz que "tudo é relativo" dificilmente se compreende que o uso do "relativo" precisa de um complemento, "relativo a quê?". Não é uma abertura absoluta do "tanto faz", mas uma afirmação poderosa para se entender o contexto em que a coisa se encontra; é a impossibilidade de se falar de algo apenas no mundo da abstração, forçando a ancoragem do assunto com todas as coisas em torno dele; mais que uma abertura a todas as possibilidades é a necessidade de se falar com mais conhecimento de tudo que está conectado ao assunto. Portanto, não é para se desistir do debate, mas pelo contrário, é um chamado ao aprofundamento e de um maior rigor, sem contudo acreditar chegar num ponto final universal.


Contudo, a produção de sentido se dá mais num nível político do que intelectual, portanto, é na vitória de uma idéia seja lá por qual meio que constrói-se a realidade...quem souber entender, que entenda.

segunda-feira, 22 de março de 2010

segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

No Portal

"Vê este portal, anão!", continuei  a falar: "ele tem duas faces. Dois caminhos se juntam, aqui: ninguém ainda os seguiu até o fim.

Este longo corredor para trás: ele dura uma eternidade. E aquele longo corredor para diante - é uma outra eternidade.

Eles se contradizem, esses caminhos; eles se chocam frontalmente: e aqui neste portal é onde eles se juntam. O nome do portal está escrito ali em cima: 'Instante'